Mesmo quem não conseguiu participar pessoalmente do South by Southwest (SXSW), um dos maiores festivais de inovação e tecnologia do mundo, percebeu que um dos temas mais discutidos da edição 2023 foi inteligência artificial.
Março de 2023 – Mesmo quem não conseguiu participar pessoalmente do South by Southwest (SXSW), um dos maiores festivais de inovação e tecnologia do mundo, percebeu que um dos temas mais discutidos da edição 2023 foi inteligência artificial.
Durante o SXSW, os participantes disputaram um lugar na palestra com Greg Brockman cofundador e presidente do ChatGPT. Para além dos pontos abordados sobre o quanto a inteligência artificial poderá aumentar a produtividade dos profissionais, auxiliar na criatividade e transformar a saúde, uma pauta foi esquecida: a OpenAI , ChatGPT, usou trabalhadores quenianos para filtrar conteúdo no chatbot.
Em janeiro de 2022, houve uma reportagem da revista Time destacando como os quenianos desenvolveram traumas psicológicos ao serem submetidos a moderação de conteúdos com temas relacionados à abuso sexual, assassinato, estupro, suicídio e outros. Sem contar que recebiam um salário entre US$ 1,31 e US$ 2 por hora.
Quando questionamos sobre os riscos de inteligências artificiais (AI) substituírem o trabalho humano, é comum ouvir que os robôs agregam em eficiência à performance humana, mas que o humano é insubstituível. Mas o mercado está cada vez mais apegado à eficiência sobre-humana. Não à toa, o ChatGPT alcançou, em apenas dois meses após o lançamento, cerca de 100 milhões de usuários mensais ativos, segundo dados da pesquisa do Union de Banques Suisses. A título de comparação, o Facebook levou 4 anos para alcançar o número de 100 milhões de contas ativas. O levantamento sobre a marca de cadastros alcançada por outras plataformas fez o ChatGPT ganhar o posto de “aplicativo de consumo com crescimento mais rápido da história”
Esses dados refletem a aprovação — e a divulgação feita — por quem usa. Mas é importante considerar que, quando fazemos as análises sobre os riscos aos postos de trabalho, a verdadeira discussão não é sobre quem faz melhor, se a máquina ou a pessoa humana, mas sim sobre o que os tomadores de decisão nas empresas consideram mais importante: economizar em contratações ou cumprir a função social de continuar gerando emprego e renda com trabalho baseado em vivências reais e repertórios não mecanizados?
Alguns dados podem contribuir para análises futuras — e do agora.
De acordo com levantamento da Layoffs.fyi, uma plataforma que monitora demissões nos EUA, nas primeiras cinco semanas de 2023, 95 mil trabalhadores foram demitidos de companhias de tecnologia. Isso equivale a quase 60% de todas as demissões que ocorreram em todo o ano de 2022. Empresas como Google, Amazon, Dell, Microsoft fazem parte dessa lista. Vale destacar que as mulheres representam 46% dessas demissões no setor de tecnologia, segundo o jornal The Washington Post.
Outra pesquisa, realizada em 2009, revela que as demissões em massa causa danos à saúde mental e física dos trabalhadores que permanecem nas empresas: a probabilidade de desenvolver doenças cardíacas, hipertensão, estresse e artrite aumenta em 83% nos primeiros 15 a 18 meses após o episódio da demissão — levando em consideração pessoas sem problemas de saúde pré-existentes. Além disso, a produtividade dos funcionários tende a ser afetada após ondas de demissões, como apontaram levantamentos do Grupo Metrus, uma empresa de pesquisa organizacional americana
Esse novo cenário tem impacto em remuneração, geração de renda e no futuro de pessoas que compõem as maiorias invisibilizadas na sociedade — e nesses espaços. Como poderemos falar de trabalho decente e crescimento econômico, um dos objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS) da ONU, se entre os riscos relacionados à chegada de inteligências artificiais está a redução de salários por redução nas horas trabalhadas? Isso que significa insegurança financeira e ao bem-estar dos trabalhadores, fazendo com que o Brasil continue no pódio de país mais ansioso do mundo, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Temas como inteligência artificial, o futuro das startups , saúde mental surgiram no SXSW. Mas em não houve tanto questionamento trazendo luz para mostrar que o boom da inteligência artificial, as demissões em massa e a crise de saúde mental que estamos vivendo, nos mostram que cada vez mais se faz necessário os compromissos das empresas aos Movimentos do Pacto Globo da ONU. Garantir salário digno para os trabalhadores, alcançar a meta de 1.500 empresas comprometidas em ter 50% de pessoas negras em posição de liderança e chegar em 2030 com 1.000 empresas com programas estruturantes de saúde mental, impactando 10 milhões de trabalhadores com essas iniciativas.