Na ocasião a CEO do Pacto Global recebeu uma carta aberta sobre os Direitos Humanos na perspectiva do Povo Negro
Dezembro de 2022 – A CEO do Pacto Global da ONU, Sanda Ojiambo, participou de um brunch no sábado, 10, na casa da empresária Rachel Maia, CEO da RM Consulting, em São Paulo. Estiveram no evento cerca de 30 personalidades negras brasileiras. Rachel Maia faz parte do Programa Liderança com Impacto pelo Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 5 (ODS 5), de igualdade de gênero, no Pacto Global da ONU e embaixadora do Pacto das Pretas.
“O acesso à educação básica de qualidade é a melhor forma de o Brasil superar a desigualdade entre negros e não negros e promover a inclusão da população preta e parda na economia e na sociedade.” Para Ojiambo, o país precisa investir em educação fundamental de qualidade para formar a base de pessoas pretas e partas que vai se inserir de modo mais intenso na área corporativa e nas universidades.
“Pelo que eu vi da população brasileira, são 56% de negros, mas nem todos frequentam a escola, eles ainda não estão no ambiente corporativo, no ambiente acadêmico”, comentou. Para ela, por meio da educação, de cotas raciais e outras políticas afirmativas será possível fazer a colocação justa da população negra no mercado de trabalho. “Os negócios precisam ser mais inclusivos, isso é uma meta que já temos no Pacto Global.”
Ela afirmou também que a igualdade racial é um dos objetivos a serem perseguidos mundialmente e defendeu uma ação mais efetiva do poder público mas, principalmente, das empresas. “Eu particularmente me interesso pelos negócios, e nota-se que os negócios acabam sendo liderados por homens, e na grande maioria, brancos”, comentou.
Rachel Maia entregou a Ojiambo uma carta aberta com reflexões que, segundo o documento, “fortalecem a nossa ousadia e esperança na possibilidade de ocuparmos espaços antes nunca nem mesmo sonhados pelo nosso povo preto”. A carta traz declarações de várias personalidades presentes no encontro.
O documento afirma também que a agenda oriunda da declaração de Durban “reforça a necessidade do planejamento coletivo para suprir as necessidades da geração atual, pavimentando o caminho para as gerações futuras dentro e fora das empresas”. Durban, na África do Sul, sediou a Terceira Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância em 2021. O documento final do encontro trata do “combate de todas as formas de racismo e discriminação racial”.
Confira a carta na íntegra:
Carta aberta à Sanda Ojiambo:
A conjunção de pensamentos de outras pessoas negras, assim como nós, me sensibiliza, inspira e move a lhe escrever estas poucas linhas, oriundas de uma mulher de pele retinta, de origem humilde e mãe da Sarah e do Pedro. Reflexões essas que fortalecem a nossa ousadia e esperança na possibilidade de ocuparmos espaços antes nunca nem mesmo sonhados pelo nosso povo preto.
Hoje é um dia que celebro, ao recebê-la aqui em minha casa, ao lado de meus amigos.
Sobre os Direitos Humanos na Perspectiva do Povo Negro
A declaração de DURBAN, que nasceu durante a realização da Terceira Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância, apresenta os Direitos Humanos na Perspectiva do Povo Negro. Trata-se de um documento orientado para o combate de todas as formas de racismo e discriminação racial. A iniciativa foi realizada pela Organização das Nações Unidas (ONU), entre 31 de agosto e 8 de setembro de 2021, na África do Sul. A agenda reforça a necessidade do planejamento coletivo para suprir as necessidades da geração atual, pavimentando o caminho para as gerações futuras dentro e fora das empresas.
A partir dessa formalização, temos alguns compromissos listados que, colocados em prática terão impactos no setor público e privado, que aplicam os Princípios Orientadores Sobre os Negócios e Direitos Humanos (UNGPs). Combater os diferentes tipos de discriminação e mensurar os impactos sobre a implantação de políticas antidiscriminatórias é um dever e responsabilidade de toda a sociedade.
Compartilho o que pensam alguns executivos sobre os Direitos Humanos na Perspectiva de Pessoas Negras:
“Diariamente os direitos das pessoas negras brasileiras são violados, em especial, o nosso direito mais básico que é a vida. Parafraseando Conceição Evaristo, “se combinaram de nos matar, nós combinamos de não morrer” e, assim, seguiremos hackeando sistemas e sendo revolucionários vivos e felizes.”
Fernanda Ribeiro – Conta Black É muito importante a citação de uma referência para as pessoas negras com isso, não podemos ignorar as formas contemporâneas de racismo, precisamos romper os silos.
Rachel Maia “Os países em desenvolvimento e, em especial o Brasil, necessitam estar amparados em políticas públicas de reparação: o conjunto de ações reparativas e protetivas que constituem a noção de Direitos Humanos deve ser celebrado e, acima de tudo, fomentado, quando o quesito raça se faz presente. Como um dos últimos países a abolir a escravidão, o Brasil precisa caminhar com reparações sociais, econômicas, da saúde, da habitação, educacionais e culturais. Um país onde os negros (pretos e pardos) compõem a maioria populacional, não pode aceitar o racismo estrutural pacificamente. É preciso ser urgente nas pautas emergenciais, a fim de combater a letalidade negra, sobretudo a letalidade de jovens negros.”
Carla Zulu – Museu das Favelas Não podemos esquecer das responsabilidades que mais impactam os corpos negros, como nos define Achille Mbembe sobre a necropolitíca. Hoje, os Direitos Humanos são discutidos apenas em uma pequena bolha que não é o estratégico.
“O racismo resiste enquanto ideologia que visa legitimar as violências sofridas pela população negra. Em contrapartida, a luta antirracista figura como único remédio capaz de resguardar corpos pretos e garantir sua ascensão”.
Stella Ferreira – COSAN Falar em luta antirracista é falar de garantia de direitos fundamentais. Não podemos falar sobre nós, sem nós. O negro deve estar em todos os eixos estratégicos do negócio (Pessoas, Processo e Resultado).
“Os Direitos humanos negros garantem às pessoas negras a existência plena, com direito à saúde, educação, emprego e desenvolvimento integral. Pensar em direitos humanos exige um olhar atento às interseccionalidades de gênero e raça.”
Elizabete Leite Scheibmayr – CEO Uzoma Diversidade Os atravessamentos das mulheres negras nos permitem conhecer seus marcadores sociais e, a partir de então, compreender as desigualdades que as impactam. Para mitigar essas desigualdades, precisamos buscar normas e práticas efetivas com instrumentos democráticos e sustentáveis, bem como acordos internacionais.
“Direitos humanos dos negros devem garantir que qualquer homem ou mulher negra possa ir, ficar, permanecer e sair de qualquer espaço público e privado, de forma livre e sem constrangimento. Os Direitos humanos dos negros precisam permitir e garantir o total acesso e a interação plena com a história e cultura da África, dos negros no Brasil e, também, garantir a participação de pessoas negras de forma igualitária e democrática na comunicação social do país.”
Prof. José Vicente – reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares Precisamos desenvolver uma sistematização Global para trazer os Direitos Humanos para dentro do Universo Corporativo.
“Os direitos humanos dos negros são os direitos humanos dos brasileiros, pois a população negra é majoritária na população brasileira. E a luta negra não é sobre um Brasil para negros, mas sim sobre um Brasil para todos, sem racismo, que contemple em suas políticas públicas e privadas todo o seu povo, explicitando que a diversidade é a nossa maior riqueza.”
Cida Bento – fundadora do Ceert Ser humano que converge em sua diversidade gerando assim espaços seguros, com o autocuidado e, com isso, provando sua rentabilidade sustentável para o Business.
“Nós afro-brasileiros/as estamos correndo atrás do prejuízo da exploração gerada pela escravização e exclusão deliberada dos sistemas que sucederam ao COLONIALISMO. A Associação Pacto pela Equidade Racial é uma das mais eficientes ferramentas para avançarmos nos próximos 10 anos”.
Frei David Santos OFM O Pacto Global da ONU – Rede Brasil, tem sido precursor de grandes transformações, levando os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) para o ambiente corporativo, como parte fundamental para a transformação cultural, perenidade e sustentabilidade do negócio. E a Associação Pacto de Promoção da Equidade Racial está trazendo um olhar para a agenda ESG, sigla que traduzida para o português significa Meio Ambiente, Social e Governança, na perspectiva da comunidade negra.
“Queríamos que, de fato, os negros no Brasil pudessem vivenciar efetivamente os seus “direitos humanos”, como preconizados na “Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948”. Vivenciar os processos de igualdade e de direitos para os negros no Brasil ainda é uma realidade distante daquela preconizada em 1948. A necessidade de políticas de cotas e programas de inclusão são ações típicas, que evidenciam o quanto temos que caminhar para que a população negra brasileira possa ocupar os espaços de poder, dominados pela população branca. Nunca é demais ressaltar que os favelados, os presos, os excluídos, os famintos no Brasil têm, em sua maioria, a pele negra. O fim do processo oficial de escravização, em 1888, não permitiu, depois de mais de 120 anos, o exercício pleno de igualdade de oportunidades entre negros e brancos. Trago como exemplo de ausência de igualdade de oportunidades a área econômica no Brasil. Quantas mulheres negras, economistas, possuem destaque nacional? Em suma, queremos apenas exercer o nosso direito de igualdade numa sociedade excludente como a brasileira e, por isso, perniciosa para com a população negra.”
Belline Santana (Banco Central) “Os direitos humanos e as políticas públicas e privadas não têm sido efetivos para as mulheres negras no Brasil. Não estamos nos espaços de poder, somos a maioria nos principais indicadores da desigualdade no Brasil.”
Jandaraci Araujo – CFO 99 Job. O marco dos Direitos Humanos no que tange ao Brasil é a nossa carta magna que ali expressa a equidade com as desigualdades existentes.
“O racismo estrutural e sistêmico precisa de ações estruturantes e sistêmicas, para que, de verdade, os Direitos Humanos das pessoas negras existam, pois hoje, esses direitos são praticamente inexistentes. Com aliados, protagonistas, ações intencionais, valorizando e criando oportunidades para a população negra, poderemos mudar esse cenário, mas precisamos ser rápidos e intensos, pois o tempo está passando muito rápido, e os resultados estão aparecendo de forma muito lenta.”
Edvaldo Vieira – CEO da Amil É muito importante ressaltar o relatório lançado pela Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o racismo sistêmico. Sim, temos uma urgência para os impactos dos resultados das ações efetivas.
“A concepção de Direitos Humanos em sua essência, como a própria palavra já diz, são os Direitos Humanos. Porém, a história recente da humanidade tem mostrado que alguns grupos historicamente discriminados como mulheres, negros e indígenas têm sido perseguidos, descuidados, mortos e segregados de forma desumana. Não existe falar em Direitos Humanos sem, essencialmente, falar desses grupos.”
Maurício Pestana – fundador da Revista Raça “Garantir direitos iguais para todas as pessoas é essencial para o desenvolvimento e a liberdade de qualquer nação. O Brasil é o 5º maior país do mundo e a maioria de sua população é formada por negros (aproximadamente 56%). Vivemos em um cenário de intensa desigualdade racial e, garantir direitos e oportunidades para todas as pessoas, além de ser o certo a se fazer, também é um fator decisivo para o progresso de um país como o Brasil. Meu compromisso pessoal e profissional, como mulher negra ocupando cargo de liderança na maior empresa de bebidas e alimentos do mundo, é atuar com ações concretas para transformar a realidade atual.”
Helen Andrade – head de diversidade e inclusão e diretora da Fundação Nestlé Precisamos assumir um compromisso genuíno com essa agenda, com mais mulheres negras no centro do debate, contribuindo para mudanças concretas e trazendo mais equilíbrio para a pirâmide das empresas.
“Que a cada dia, mais pessoas negras possam estar e desempenhar seus papéis nos setores públicos, privados ou onde se sentirem mais à vontade. Para isso, precisamos continuar avançando, de forma urgente, para que as nossas crianças negras, de hoje, cresçam em um mundo onde exista, de fato, equidade, inclusão e diversidade.”
Maurício Rodrigues – presidente da Bayer Crop Science na América Latina Estamos pavimentando um caminho para as próximas gerações colherem o nosso plantio.
“Direitos humanos negros, uma redundância mais do que necessária.
Considero uma redundância essencial e urgente dos nossos tempos”.
Raquel Virgínia – CEO Nhaí Vidas negras importam! Como nos ensina Conceição Evaristo, eles combinaram de nos matar, e nós combinamos de não morrer. Combinamos de nos mantermos vivos.
“Tenho acompanhado com muita preocupação o aumento dos discursos de ódio contra negros nas redes sociais. Em uma conjuntura de ódio político, discursos ultraconservadores e crescimento de células neonazistas, ficou evidente no Brasil um de seus maiores problemas: o racismo. Meu mestrado evidenciou que os discursos de ódio contra negros têm aparecido com características de “eliminação”. A ordem discursiva poderia estar agravando a violência que já atinge corpos negros?”
Luciana Barreto – CNN “O fortalecimento dos direitos humanos e as conquistas que ainda almejamos como nação… passam pela urgência e foco no desenvolvimento de ações coletivas. Juntos garantimos, cobramos e avançamos muito mais… para o benefício comum.”
Joyce Ribeiro Estamos nos aquilombando para, assim, construir uma narrativa de coletividade dentro e fora das empresas. Com o propósito de acelerar o compromisso por mais lideranças negras e uma sociedade equânime onde se sintam pertencentes ao ecossistema. E, assim, conectados à agenda 2030.
Confira algumas fotos do encontro: